sexta-feira, 26 de junho de 2009

Reintegração de Posse do prédio do INSS.














A ação da Reintegração de posse iniciou por volta das 10h da manhã do dia de hoje, com a chegada da Polícia Federal.













Os ocupantes decidiram se manter no prédio defendendo que a ocupação é legítma, uma vez que não possuem moradia e o recinto, pertencente a um orgão governamental, está sem uso- e sem previsão de uso- há 5 anos.

Com a chegada da Polícia Federal, os ocupantes saíram as sacadas cantando palavras de ordem e pronunciando falas em defesa da ocupação.









Por volta das 11h a Polícia Militar começou a primeira ameaça de retirar da frente da porta do prédio do INSS os apoiadores da ocupação que ali se mantinham no intuito de impedir a entrada dos policiais no prédio. Pouco tempo depois, a Tropa de Choque chegou e enquanto isso, os PMs começavam a cercar os apoiadores na porta do prédio.













Em seguida, a PM começou a empurrar e jogar spray de pimenta nos apoiadores que se mantinham de braços dados, em frente a porta do prédio, dizendo palavras de ordem.












Não conseguindo deslocar os manifestantes de braços dados que assim se mantinham mesmo após o spray, os políciais arrancaram pessoas do cordão humano, as segurando com um cacetete pelo pescoço.













Bombas de efeito moral foram jogadas. Uma dessas foi atirada para o alto, quase atingindo os ocupantes do prédio, dentre elas e eles, uma mulher que carregava o filho recém-nascido.


Após a dispersão brutal dos apoiadores, a tropa de choque cercou a porta do prédio e a PM tentou em vão abri-la. Bombeiros chegaram ao local e cortaram a porta com uma serra elétrica. Isso não foi o bastante para desbloquear a entrada da construção. Mas assustados com a violência e abuso de poder da Polícia, os ocupantes decidiram sair do prédio para evitar que a Polícia entrasse e agredisse as crianças e mulheres gestantes.




Depois de serem despejados, os sem teto se instalaram em frente ao prédio administrativo do INSS para protestar contra a situação ocorrida. Disseram que continuarão nesse local até que as autoridades lhes forneça um prédio inativo para ocuparem.


Relato de uma moradora.

"72 famílias, sendo 28 crianças, dentre camelôs, estudantes,

trabalhadores com carteira assinada foram despejados do prédio sitiado

na rua Mem de Sá, 234, centro do RJ, com truculência e violência. Três

pessoas foram presas. A primeira iniciativa foi lançar spray de

pimenta e gás lacrimogênico, que causou lesões em profissionais da

imprensa e muitas pessoas no prédio passaram mal, inclusive uma

criança de 20 dias que imediatamente vomitou.

As famílias estavam sendo acompanhados pela defensoria pública de

terras e habitação, todos tentavam uma negociação entre a secretaria

de habitação e a União. Estão aguardando na praça em frente ao INCA,

sem comida, sem orientação de para onde ir.

Histórico: essas pessoas ocupavam o prédio abandonado da rua Gomes

Freire, 510, qdo o prédio foi interditado por laudo da vigilância

sanitária de que corriam risco de desabamento. Foi dado 72h para

retornarem e passaram 1 mês na rua sem nenhuma providência.

O prédio atual está abandonado há 5 anos e é do INSS".



Relato de um manifestante.

Rio, sexta-feira, 26 de junho de 2009. Meio-dia, aproximadamente.

(Assim chamou-se a vitoriosa ocupação da Mem de Sá, e se dizemos vitoriosa, mesmo desalojada, é porque em tempo algum a estupidez venceu as flores).

Bombas de efeito imoral... Coturnos e cassetetes.. . Spray... Meu rosto vermelho de ódio e pimenta! Tanta força bruta, pouco direito, pouca educação... Ordem para os pobres, progresso para os ricos!, alguém já deve ter dito isso antes ...
A constituição rasgada diante dos nossos olhos, a truculência policial desfilando na avenida..., Sete de setembro? Não, despejo. Cacos de direitos humanos pelo chão... Falou-se em cumprimento da lei, mas cumprimento da lei não implica em humilhação e tortura, e se a lei não serve ao povo, e se o povo é a maioria, ora, então de que serve a lei? Era mais que “dever” aquilo, era perversão mesmo, fetiche... Aqueles homens (?) se realizavam em sua violência... Alguns riam... Risos.

Crianças cantavam... Cantavam alegremente. .. Cantavam loucamente.. . E o desespero se misturava ao amor... Cantavam palavras de ordem, cantavam o hino nacional, e também canções religiosas.. . Que importa?! As crianças cantavam, e cantando se formavam numa autêntica Educação para a democracia! De maneira irônica e mesmo heróica os princípios políticos proclamados na LDB se cumpriam, crianças sem casa e talvez sem escola, mas não sem educação.

Sim, aquilo era Educação popular, um processo genuíno de formação política das classes populares, um ato educativo, pedagógico mesmo. E formando-os, também nos formávamos. Educação com o povo, educação popular.

Agora, detidos e transportados como animais na traseira de um Camburão, dividindo um espaço ínfimo, quase sufocados, no auge do nosso sofrimento, o companheiro Vlad. voltou-me os olhos úmidos e sorrindo, perguntou:

- Como vai a vida, companheiro? Está amando?
- Sim, amo, - respondi - mas não vou bem na faculdade...

E rimos, e assim sublimamos o sofrimento. A luta política é antes uma forma de ressignificar o sofrimento humano. O Vlad. pensou que morreríamos (porque a viatura tomara um destino diferente do informado), eu só queria sair dali, mesmo que fosse para isso - estava sufocando e àquela altura me concentrava em respirar. Em certo ponto daquele passeio bizarro, disse-lhe: - É só se concentrar, companheiro, concentre-se. .. Nossa companheira, no banco da frente, discutia firme e serena com o policial, e foi chamada de safada e palhaça por ele... Lá de trás, tivemos que ouvir isso em silêncio... A companheira E. continuava contestando e resistia bravamente. Minutos antes, num gesto de paixão e desprendimento, a companheira D. lançara de volta um jarro de mágoas que um soldado romano havia atirado em nós, e o jarro enfumaçava a rua... E era como um incenso, incenso de repressão...
Em certa altura da Batalha, tive a impressão de que a repressão do estado pesa de forma mais contundente sobre aqueles que têm a pele mais escura, ou menos clara, como queiram... Ouvi relatos da companheira G. voando pelos ares, enquanto eu era “conduzido” (recebendo uma “gravata”) com o corpo dobrado para frente, como em gesto de obediência e submissão... Não houve ofensa racial, de fato, mas houve tratamento racial; ali eu fui, sem dúvida, um escravo sendo capturado por um capitão do mato. O meu Black voava pelo ar, de pé para a luta. Vale dizer que aquela ocupação era negra. Neste país, o poder senti-se mais a vontade para se exercer sobre os não-brancos. Estávamos ali, e pessoas brancas e de belos olhos também lutavam e resistiam bravamente, e sofriam, e eram esmagados... E havia beleza e horror naquilo tudo!

Sim, esmagados em plena a democracia, a ditadura continua para os pobres em geral e para os negros em específico.

Por fim chegamos, e após uma eternidade saímos. E quando saímos tocava em algum canto da cidade uma canção do Bob Dylan, e sabíamos então que estávamos livres... Livres agora... Abraçamo-nos todos e todas, durante todo processo amparados por um bravo advogado, o companheiro e Dr. A.P, homem de meia-idade que trazia nos olhos o brilho vivo da ideologia, e animados pelo encorajamento de outros lutadores e lutadoras. (E enquanto isso ocorria, muitos outros continuaram na praça de guerra, acompanhando, registrando e orientando todo o processo)
Demos mais um passo em liberdade, e derrepente era preciso continuar a luta, a luta continua, alguém diria, havia inúmeras famílias desalojadas. .. Era preciso ainda ocupar e resistir!


R.Q.


P.S. Não participei organicamente do processo desta ocupação, nem posso me considerar diretamente engajado neste movimento. Somente compareci ao ato em solidariedade a causa, e neste sentido aproveito para manifestar o meu amor e respeito não somente às famílias ocupadas, mas a todos os companheiros e companheiras que efetivamente constroem esta luta no cotidiano das ocupações sem-teto do Rio de janeiro. O movimento estudantil tem muito a aprender com as ruas...

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